segunda-feira, 19 de maio de 2008

Orientações para TRABALHO em substituição 'a saída de campo

ATIVIDADES DESTINADAS AOS ALUNOS QUE NÃO PARTICIPAREM DO TRABALHO DE CAMPO ( INDIVIDUAL OU EM GRUPO DE ATÉ 3 ALUNOS )


1) REALIZAR PESQUISA BIBLIOGRÁFICA E APRESENTAR TRABALHO ESCRITO, CONFORME A SEGUINTE ESTRUTURA:

- CAPA
- INTRODUÇÃO
- DESENVOLVIMENTO
- CONCLUSÃO
- BIBLIOGRAFIA

- MÍNIMO DE 10 E MÁXIMO DE 20 LAUDAS
- FIGURAS E IMAGENS DEVEM SER INSERIDAS NO CORPO DO TEXTO, COM CITAÇÃO DA FONTE.
- PARA CITAÇÕES DE TEXTOS, SEGUIR NORMAS DA ABNT

ESCOLHER UM DOS SEGUINTES TEMAS:

- MATA ATLANTICA: DISTRIBUIÇÃO TERRITORIAL PRIMITIVA NO CENTRO-SUL, DESMATAMENTO E ÁREAS REMANESCENTES ATUAIS.

- BAÍAS E MANGUEZAIS NA REGIÃO CENTRO-SUL: PRINCIPAIS OCORRENCIAS E AMEAÇAS

- A GEOMORFOLOGIA DO SUL E SUDESTE DO BRASIL: CARACTERIZAÇÃO E RELAÇÕES COM A DISTRIBUIÇÃO DOS RECURSOS MINERAIS

- O DESENVOLVIMENTO DA REDE URBANA DO CENTRO-SUL DO BRASIL E A SITUAÇÃO ATUAL

- A DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA INDUSTRIA BRASILEIRA E O PAPEL DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA



DATA PREVISTA PARA ENTREGA: 16-06

segunda-feira, 7 de abril de 2008

MAPA PROJETO SÃO FRANCISCO

Transposição do São Francisco: artigo de Ab Saber

A quem serve a transposição do São Francisco?,
24-02-2005

A quem serve a transposição do São Francisco?, artigo de Aziz Ab’Saber Aziz apresentou este texto no debate na ‘Folha de SP’ sobre a transposição do Rio São Francisco, em que se manifestou contrário à obra Aziz Ab'Sáber é geógrafo, professor-emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, professor convidado do Instituto de Estudos Avançados da USP, ex-presidente e presidente de honra da SBPC. Artigo publicado pela ‘Folha de SP’:


É compreensível que em um país de dimensões tão grandiosas, no contexto da tropicalidade, surjam muitas idéias e propostas incompletas para atenuar ou procurar resolver problemas de regiões críticas.

Entretanto, é impossível tolerar propostas demagógicas de pseudotécnicos não preparados para prever os múltiplos impactos sociais, econômicos e ecológicos de projetos teimosamente enfatizados.

Tem faltado a eventuais membros do primeiro escalão dos governos qualquer compromisso com planificação metódica e integrativa, baseada em bons conhecimentos sobre o mundo real de uma sociedade prenhe de desigualdades.

Nesse sentido, bons projetos são todos aqueles que possam atender às expectativas de todas as classes sociais regionais, de modo equilibrado e justo, longe de favorecer apenas alguns especuladores contumazes. Pessoalmente, estou cansado de ouvir propostas ocasionais, mal pensadas, dirigidas a altas lideranças governamentais.

Nas discussões que ora se travam sobre a questão da transposição de águas do São Francisco para o setor norte do Nordeste Seco, existem alguns argumentos tão fantasiosos e mentirosos que merecem ser corrigidos em primeiro lugar.

Referimo-nos ao fato de que a transposição das águas resolveria os grandes problemas sociais existentes na região semi-árida do Brasil. Trata-se de um argumento completamente infeliz lançado por alguém que sabe de antemão que os brasileiros extra-nordestinos desconhecem a realidade dos espaços físicos, sociais, ecológicos e políticos do grande Nordeste do país, onde se encontra a região semi-árida mais povoada do mundo.

O Nordeste Seco, delimitado pelo espaço até onde se estendem as caatingas e os rios intermitentes, sazonários e exoreicos (que chegam ao mar), abrange um espaço fisiográfico socioambiental da ordem de 750.000 quilômetros quadrados, enquanto a área que pretensamente receberá grandes benefícios abrange dois projetos lineares que somam apenas alguns milhares de quilômetros nas bacias do rio Jaguaribe (Ceará) e Piranhas/Açu, no Rio Grande do Norte.

Portanto, dizer que o projeto de transposição de águas do São Francisco para além Araripe vai resolver problemas do espaço total do semi-árido brasileiro não passa de uma distorção falaciosa.

Um problema essencial na discussão das questões envolvidas no projeto de transposição de águas do São Francisco para os rios do Ceará e Rio Grande do Norte diz respeito ao equilíbrio que deveria ser mantido entre as águas que seriam obrigatórias para as importantíssimas hidrelétricas já implantadas no médio/baixo vale do rio -Paulo Afonso, Itaparica, Xingó.

Devendo ser registrado que as barragens ali implantadas são fatos pontuais, mas a energia ali produzida, e transmitida para todo o Nordeste, constitui um tipo de planejamento da mais alta relevância para o espaço total da região.

De forma que o novo projeto não pode, em hipótese alguma, prejudicar o mais antigo, que reconhecidamente é de uma importância areolar. Mas parece que ninguém no Brasil se preocupa em saber nada de planejamentos pontuais, lineares e areolares. Nem tampouco em saber quanto o projeto de interesse macrorregional vai interessar para os projetos lineares em pauta.

Segue-se na ordem dos tratamentos exigidos pela idéia de transpor águas do São Francisco para além Araripe a questão essencial a ser feita para políticos, técnicos acoplados e demagogos: a quem vai servir a transposição das águas? Uma interrogação indispensável em qualquer projeto que envolve grandes recursos, sensibilidade social e honestas aplicações dos métodos disponíveis para previsão de impactos.

Os ‘vazanteiros’ que fazem horticultura no leito dos rios que ‘cortam’ -que perdem fluxo durante o ano- serão os primeiros a ser totalmente prejudicados. Mas os técnicos insensíveis dirão com enfado: ‘A cultura de vazante já era’.

Sem ao menos dar qualquer prioridade para a realocação dos heróis que abastecem as feiras dos sertões. A eles se deve conceder a prioridade maior em relação aos espaços irrigáveis que viessem a ser identificados e implantados.

De imediato, porém, serão os fazendeiros pecuaristas da beira alta e colinas sertanejas que terão água disponível para o gado, nos cinco ou seis meses que os rios da região não correm. É possível termos água disponível para o gado e continuarmos com pouca água para o homem habitante do sertão.

Nesse sentido, os maiores beneficiários serão os proprietários de terra, residentes longe, em apartamentos luxuosos em grandes centros urbanos.

Sobre a viabilidade ambiental pouca coisa se pode adiantar, a não ser a falta de conhecimentos sobre a dinâmica climática e a periodicidade do rio que vai perder água e dos rios intermitentes-sazonários que vão receber filetes das águas transpostas.

Um projeto inteligente e viável sobre transposição de águas, captação e utilização de águas da estação chuvosa e multiplicação de poços ou cisternas tem que envolver obrigatoriamente conhecimento sobre a dinâmica climática regional do Nordeste.

No caso de projetos de transposição de águas, há de ter consciência que o período de maior necessidade será aquele que os rios sertanejos intermitentes perdem correnteza por cinco a sete meses. Trata-se porém do mesmo período que o rio São Francisco torna-se menos volumoso e mais esquálido. Entretanto, é nesta época do ano que haverá maior necessidade de reservas do mesmo para hidrelétricas regionais. Trata-se de um impasse paradoxal, do qual, até agora, não se falou.

Por outro lado, se esta água tiver que ser elevada ao chegar a região final de seu uso, para desde um ponto mais alto descer e promover alguma irrigação por gravidade, o processo todo aumentará ainda mais a demanda regional por energia.

E, ainda noutra direção, como se evitará uma grande evaporação desta água que atravessará o domínio da caatinga, onde o índice de evaporação é o maior de todos? Eis outro ponto obscuro, não tratado pelos arautos da transposição.

A afoiteza com que se está pressionando o governo para se conceder grandes verbas para início das obras de transposição das águas do São Francisco terá conseqüências imediatas para os especuladores de todos os naipes.

Existindo dinheiro - em uma época de escassez generalizada para projetos necessários e de valor certo -, todos julgam que deve ser democrática a oferta de serviços, se possível bem rentosos. Será assim, repetindo fatos do passado, que acontecerá a disputa pelos R$ 2 bilhões pretendidos para o começo das obras.

O risco final é que, atravessando acidentes geográficos consideráveis, como a elevação da escarpa sul da chapada do Araripe -com grande gasto de energia!-, a transposição acabe por significar apenas um canal tímido de água, de duvidosa validade econômica e interesse social, de grande custo, e que acabaria, sobretudo, por movimentar o mercado especulativo, da terra e da política. No fim, tudo apareceria como o movimento geral de transformar todo o espaço em mercadoria.
(Folha de SP, 20/2)

TRANSPOSIÇÃO DO SÃO FRANCISCO: MINISTERIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL

http://www.integracao.gov.br/saofrancisco/integracao/index.asp

TRANSPOSIÇÃO DO SÃO FRANCISCO: reportagem

Integração do São Francisco prioriza
desenvolvimento econômico regional

O projeto de Integração do Rio São Francisco com bacias hidrográficas do Nordeste setentrional tem uma ambição que há mais de cem anos aflige governo e sociedade: acabar com o problema da seca no semi-árido brasileiro. A proposta tem uma história tão antiga quanto a seca na região e o debate, que também é tão antigo quanto polêmico, é polarizado pelos argumentos contrários ou favoráveis ao projeto. De um lado, o governo afirma que a Integração do São Francisco é a única obra viável, econômica e geograficamente, para garantir a segurança hídrica da população do semi-árido. De outro, alguns dos pesquisadores que estudam o semi-árido garantem que o montante investido pelo governo é desperdício de dinheiro público. Para eles, a solução para o semi-árido não estaria em “obras faraônicas”, mas na multiplicação de pequenas obras que o sertanejo conhece melhor do que ninguém.

Fotos: André Gardini


Rio São Francisco divide os estados de Alagoas e Sergipe


Se por um lado o governo afirma que o objetivo principal do projeto é salvar a população do semi-árido do sofrimento da seca, melhorando as condições de vida de cerca de 12 milhões de brasileiros, pesquisadores como Manuel Correia de Andrade, professor de geografia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), contestam, dizendo que os interesses de grandes grupos econômicos tendem a ser favorecidos, “porque o retorno do capital investido na grande empresa é mais rápido e porque os grandes empresários têm maior poder de pressão e, por isso, conseguem mais facilmente as vantagens”. Joaquim Correia de Andrade , professor de geografia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e filho de Manuel, também questionou a utilidade do projeto. “O que adianta mais um megaprojeto, se amanhã essas águas, como acontece no médio São Francisco, irão beneficiar basicamente grupos empresariais que recebem uma infra-estrutura totalmente preparada pelo Estado a custo zero?”, declarou. Manuel Correia, que estuda a questão nordestina há 53 anos, explica que existem outras questões envolvidas na Integração do Rio São Francisco, que deveriam ser pensadas. Uma delas está ligada à estrutura fundiária. Para ele, o grande problema na região é a questão da propriedade da terra. “Fizeram uma política de irrigação no médio São Francisco, mas em vez de fazerem programas de pequenas propriedades e cooperativas, fizeram um programa ligado às grandes empresas”, critica. “Então vêm empresas do exterior ou de outras regiões do Brasil, montam empreendimentos e levam o lucro. O que fica é só o salário mínimo dos trabalhadores”.



Rio São Francisco: geração de energia em Paulo Afonso-BA


De opinião oposta, João Urbano Cagnin, coordenador dos estudos de integração de bacias da região Nordeste no âmbito do Ministério da Integração Nacional, acredita que a integração de bacias no Nordeste é sinônimo de promoção da igualdade de oportunidade para os brasileiros. “Uma pequena quantidade de pessoas serão removidas, como acontece em todas as grandes obras, porém elas têm a possibilidade de ‘ficar melhor’, pois serão indenizadas corretamente pelo governo”, afirma. “Eu defendo o projeto, pois é um dos melhores projetos que temos hoje”, acrescenta. “Os projetos de transferência de renda para os mais pobres são projetos auxiliares. Esses projetos têm sua importância, porém não conseguem levar desenvolvimento para a região. Já o projeto em questão é um projeto estruturante, ou seja, visa a geração de desenvolvimento humano e econômico para a região”. Para ele, as alternativas de combate à seca, como, por exemplo, as cisternas, a dessalinização da água do mar e a utilização de águas subterrâneas, não resolveriam o problema de desenvolvimento da região Nordeste. Não se trata apenas de água para beber, mas para manter as atividades industriais, comerciais e agrícolas da região, e essas atividades exigem uma demanda grande de água. “Sem esse recurso hídrico as indústrias novas não se instalam e, pior, as que estão lá não conseguem manter suas atividades. Existem casos de indústrias que deixaram de ir para a região porque em época de seca o governo não garante a manutenção de suas atividades, devido à falta de água”, afirma Cagnin.

A polêmica não é baseada somente na necessidade ou não da transposição: distribuição e uso das águas também estão em questão. “O que adianta ter água na minha porta se eu não terei acesso a essa água? E se eu tiver acesso a essa água eu não vou ter terra para cultivar? A questão passaria necessariamente pela água?”, questionou Joaquim Correia.

O projeto

O atual projeto de Integração, sob responsabilidade do Ministério da Integração Nacional (MIN) faz parte do Programa de Desenvolvimento Sustentável do Semi-Árido do Nordeste, junto com o Projeto de Revitalização do Rio São Francisco, do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Com recursos do governo federal – cerca de R$ 4,5 bilhões – o projeto de Integração visa captar 3,5% da vazão disponível: dos 1.850 m³/s disponíveis, 63,5 m³/s serão retirados. O projeto pretende levar água para as bacias dos rios Jaguaribe (CE), Apodi (RN), Piranhas-Açu (PB e RN), Paraíba (PB), Moxotó (PE) e Brígida (PE), através da construção de dois canais: o Leste levará água para Pernambuco e Paraíba, o Norte, já denominado Celso Furtado pelo presidente Lula, atenderá aos estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. As captações serão feitas em dois pontos: em Cabrobó e no lago da barragem de Itaparica, ambos abaixo da barragem de Sobradinho.

O eixo norte do projeto é composto por aproximadamente 402 Km de canais artificiais, quatro estações de bombeamento, 22 aquedutos e seis túneis. Nesse eixo ainda está prevista a construção de duas centrais hidrelétricas localizadas no reservatório de Jati e Atalho, ambas no estado do Ceará, com 40 Mw e 12 Mw de capacidade, respectivamente. O eixo leste terá aproximadamente 220 Km, com 5 estações de bombeamento, 5 aquedutos, 2 túneis e nove reservatórios. Na opinião de Antonio Carlos Robert de Moraes, professor de geografia da Universidade de São Paulo (USP), “o projeto é uma verdadeira ‘prótese territorial’, isto é, ‘grandes sistemas de engenharia’ para usar uma expressão do Milton Santos”. Para o pesquisador, “uma obra desse calibre deve ser analisada do ponto de vista ambiental e os processos naturais, por outro lado, as novas relações sociais e a especulação do mercado fundiário que irão surgir, com o início das obras”.

Divergências técnicas, entrave judicial
Enquanto políticos e pesquisadores debatem sobre a utilidade e os efeitos do projeto de transposição, a Agência Nacional das Águas (ANA) e o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF) não conseguem entrar em um acordo a respeito da disponibilidade hídrica do Rio São Francisco. O Comitê afirma que há um saldo disponível de 360 m³/s, mas a ANA aponta um número maior, 434 m³/s. A afirmação do Comitê de que 335 m³/s já estão outorgados é rebatido pela ANA, que afirma que apenas 91m³/s estão sendo efetivamente usados.

De acordo com a ANA, o consumo de água na Integração do Rio São Francisco, depois de pronta e funcionando a todo vapor, não deverá exceder os 327 m³/s, confirmando que há disponibilidade hídrica até 2025 para atender as demandas da Integração do Rio São Francisco. Fato este que, Moraes, professor da USP, questiona. Para ele, existe um debate onde os interesses pró ou contra comandam o raciocínio e alguns fundamentos técnicos básicos não estão claros. “Os dados [sobre vazão] da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf)”, afirma, “não batem com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Estão querendo fazer a transposição, mas no alto curso do rio, em áreas de nascentes. Há problemas de assoreamento que são evidentes e, sem dúvida nenhuma, qualquer que seja o dado de vazão, isso vai influenciar. O assoreamento é visível, há um desmatamento pesado, há lugares onde o rio está pouco profundo”.

O projeto de Integração já acumulou sucessivas derrotas e vitórias por parte do governo federal. A primeira série de audiências públicas (que aconteceram entre os dias 06 a 20 de dezembro de 2004) foi cancelada por força de liminar. O juiz da 14° Vara da Justiça Federal, João Batista de Castro Júnior, acatou argumentos de que espaços democráticos e legítimos de expressão da sociedade não estavam sendo considerados. Uma semana antes, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), que deveria votar o parecer técnico da ANA que comprova a disponibilidade hídrica para o projeto, também teve sua reunião cancelada por ação judicial. A reunião do CNRH, convocada em regime de urgência pelo ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, pretendia derrubar o parecer do CBHSF que restringiu o uso das águas do projeto apenas para consumo humano e dessedentação de animais. O governo federal detém 29 assentos no CNRH, o que lhe garante maioria absoluta no colegiado de 56 conselheiros. No dia 17 de janeiro, o governo obteve uma vitória. O CNRH votou e aprovou o projeto de Transposição. “O CNRH analisou a nota técnica 492 da Agência Nacional de Águas e constatou a existência de água suficiente no rio São Francisco para realizar a integração de bacias, sem qualquer prejuízo econômico, ambiental e social para os atuais usuários”, afirmou o ministro interino da Integração Nacional, Pedro Brito.

Com a aprovação da ANA e do CNRH para o início das obras e o fim das audiências públicas, realizadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), entre os dias 14 de janeiro e 02 de fevereiro, o próximo passo deverá ser a concessão da licença ambiental. De acordo com o Ministério da Integração Nacional, em fevereiro inicia-se o processo de licitação. As obras deverão começar em abril.

Semi-árido: região de contrastes
A região do Nordeste setentrional, que abrange parte do projeto de Integração do Rio São Francisco, tem características peculiares. Apesar do senso comum definir a região nordeste como um espaço “total”, ou seja, de características homogêneas, ela apresenta características diversas. Aziz Ab'Saber, professor da Universidade de São Paulo (USP), explica que o Nordeste não possui apenas um tipo de relevo, ecossistema, cor das águas: “é impossível trabalhar um projeto desse tipo sem trabalhar todas as situações ao longo dos diferentes terrenos”, explica. Para Ab'Saber, o primeiro passo deveria ser avaliar bem o rio e sua queda, o tamanho das propriedades, os confrontos entre os donos de fazenda de gado e o povo que faz culturas de vazantes. “Cultura de vazante é aquela que vai para as feiras do sertão, mais barata”, explica, e acrescenta que para o sertanejo o único espaço para a agricultura são as margens do rio, porque ele não tem a possibilidade de conquistar as terras altas e as encostas das colinas, que estão nas mãos dos fazendeiros. A outra opção para o agricultor seria o cultivo longe do rio, mas aí o problema é a falta da água.

A mancha semi-árida se define por uma região onde a evaporação é superior às médias pluviométricas. As chuvas são mal distribuídas no espaço e no tempo, variando entre 400mm e 600mm anuais, enquanto a perda de água por evaporação, propiciada pelos ventos, temperaturas altas e características da vegetação, pode chegar a 1800mm anuais. Apesar do Relatório de Impacto do Meio Ambiente (RIMA) da Integração do Rio São Francisco afirmar que os longos períodos de seca são fenômenos imprevisíveis, de acordo com alguns especialistas em climatologia a seca é previsível e explicável : os dois mecanismos que ajudam a prognosticar as secas são a pressão atmosférica e a temperatura.

As características climáticas introduzem um aspecto peculiar ao semi-árido nordestino e influenciam na composição do solo (pedologia), na forma do relevo (geomorfologia) e na vegetação. Jurandyr Ross, professor de geografia da USP, explica que o fator climático entra como um fator importante, mas isso não quer dizer que toda a região tenha características pedológicas iguais. “O semi-árido é um mosaico de solos, predominantemente solos rasos e solos pedregosos por causas das condições climáticas”, porém, continua, “dependendo das condições litológicas [rochas] e morfológicas, pode ter uma variação das características dos solos. Mais ou menos pedregosos, mais ou menos férteis, mais ou menos profundos: uma diversidade muito grande. No entanto, a gente generaliza, dizendo que os solos do Nordeste são rasos e pedregosos, mas lá não é tudo a mesma coisa”. Como Joaquim Correia, Manuel Correia, Moraes e Ab'Saber, Ross também se mostra preocupado com a finalidade do projeto de Integração. Ele argumenta que a agricultura feita pelo caboclo que vive no semi-árido tem uma enorme carga cultural. “Não é uma agricultura comercial, mas uma atividade familiar de baixa produtividade. É uma agricultura de 400 ou 500 anos que se faz no semi-árido. Qual é o benefício que um processo de irrigação traz? Muitos. Mas você não transforma o agricultor de agricultura cabocla, do dia para noite, em agricultor de agricultura irrigada”, completa.



O rio gera energia também para Xingó-AL


A questão então, de acordo com muitos pesquisadores, é se o projeto de Integração beneficiará a população que realmente sofre com a falta de água ou se o investimento bilionário do governo fomentará ainda mais a terrível concentração de renda do Brasil. Se a prioridade, como afirmou Cagnin, é o desenvolvimento econômico do Nordeste, quem garante que este desenvolvimento econômico beneficiará os mais necessitados e não somente as empresas de maior porte? Se a água irá salvar o semi-árido, questionam alguns pesquisadores, porque a decisão do CBHSF de direcionar as águas apenas para uso humano e dessedentação animal foi derrubada pelo CNRH? “Não se trata de enxergar o projeto como algo impossível de ser feito”, comentou Joaquim Correia. “É possível e pode ser viável, mas nesse momento, seria ela a prioridade? Ou estariam prevalecendo os interesses políticos?”.

O repórter André Gardini viajou a Pernambuco, Alagoas e Bahia com o apoio da TAM e da Chesf.

segunda-feira, 31 de março de 2008

Veja projetos e informações sobre o Brasil nos sites oficiais do governo:

http://www.integracao.gov.br/

segunda-feira, 17 de março de 2008

SUB-REGIÕES NORDESTINAS


1 - Meio Norte
2 - Sertão
3 - Agreste
4 - Zonas da Mata e Litoral

domingo, 16 de março de 2008

Nota sobre o Trabalho de campo no Paraná

O curso de Geografia da Faculdade Cenecista de Osório realiza, a cada semestre, um empreendimento de elevado valor no campo da pesquisa e do ensino. Sendo a observação e a pesquisa empírica uma das técnicas fundamentais da disciplina, os “ trabalhos de campo” organizados por seus professores, e dos quais podem participar todos os alunos do curso, objetivam promover a articulação direta entre o observador e o observado, ou entre o sujeito e o objeto.
Durante os quatro anos de duração do curso, os alunos tem oportunidade de estudar diretamente as regiões de Caxias do Sul, Itaimbezinho, Passo Fundo, Rio Grande, Santana do Livramento, Porto Alegre, além de Laguna e Serra do Rio do Rastro, em Santa Catarina. Um outro roteiro, já realizado por duas vezes e a ser repetido no presente semestre é o do Estado do Paraná. Com duração de três dias e previsão de saída para o fim do mês de maio, o roteiro inclui passagens pela Ilha do Mel, Baía e Porto de Paranaguá, Serra do Mar e Mata Atlântica, cidade de Curitiba e Arenitos de Vila Velha.
Será possível analisar a organização do espaço daquele Estado e suas relações com o Sul do Brasil, de forma mais geral, e com o Rio Grande do Sul em particular. Professores e alunos poderão observar e discutir aspectos os mais diversos como a dinâmica geomorfológica costeira; a fito e a zoogeografia no interior de baías e nas encostas tropicais ( especialmente em manguezais ); o processo de ocupação do litoral, do primeiro e do segundo planalto paranaense; o planejamento urbano de Curitiba e suas repercussões territoriais; e ainda os processos erosivos pluviais e eólios.

Prof MS Marcio Fenili Antunes

O sentido do Nordeste

O SENTIDO DO NORDESTE
Manuel Correia de Andrade

O Nordeste e a Amazônia são as duas regiões brasileiras mais discutidas, não só na mídia como nos meios acadêmicos. O fato talvez se deva a essas regiões serem relativamente bem caracterizadas, e as mais atrasadas e pobres do país.
No conjunto brasileiro, o Sudoeste, onde se situam os três principais estados - São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais - , se destaca por ser a mais rica e a mais dinâmica; o Sul, com uma formação bem diversa das do resto do país, com população em grande parte oriunda das migrações dos séculos XIX e XX, tem uma economia relativamente equilibrada, e o Centro-Oeste, ainda em povoamento, são menos alvo da curiosidade nacional.
No caso do Nordeste, são abordadas sérias questões que chegam até a colocar em dúvida a sua existência e a sua origem. Assim, para os geógrafos, o Nordeste se caracteriza por ser um território nacional onde, em uma grande porção do mesmo, domina um clima semi-árido e árido, cercada por uma periferia úmida e semi-úmida. Oficialmente, ela é formada por nove estados - Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia -, mas para efeito de ação política do Banco do Nordeste e da SUDENE, hoje extinta, ela compreende também uma grande porção do norte de Minas Gerais.
Levando-se em conta as características clássicas de uma região geográfica, firmadas no princípio da existência de domínios físicos - estrutura geológica, relevo, clima e hidrografia -, do meio biológico - vegetação e fauna - e da organização do espaço pela ação do homem, o Nordeste oficial extrapola o território do Nordeste real. Como já salientamos, na década de 70, no livro Paisagens e Problemas do Brasil, teríamos que admitir que o Maranhão e grande parte do Piauí não seriam nordestinos, mas formariam uma outra região geográfica que poderia ser chamada de Meio-Norte, região de transição entre a Amazônia e o Nordeste. Basta que se conheça o Maranhão para sentir muito mais semelhança entre ele, com a sua abundância d'água e com a presença da floresta pré-amazônica, e a Amazônia; para sentir que ele é bem diferente do Nordeste. Os seus rios caudalosos, as grandes inundações ocorridas nas enchentes, que duram meses, como nos campos de perises e a importância da economia extrativista, para caracterizá-lo como quase amazônico. Por sua vez, na porção meridional do Maranhão e do Piauí, a grande extensão das chapadas, o domínio das associações vegetais, típicas dos cerrados, e das palmeiras, o aproximam do Centro-Oeste.
No sul da Bahia, as antigas capitanias de Ilhéus e de Porto Seguro pouco têm a ver com o Nordeste, sobretudo na porção oriental, que foi, no passado, coberta por espessa floresta, semelhante à amazônica, com chuvas muito abundantes e uma curta estação seca que favoreceu o desenvolvimento da cultura do cacau. São bem mais Sudeste do que Nordeste.
Ocorre, porém, que sendo o Nordeste pobre e sujeito a secas periódicas, passou-se a identificá-lo por essas características e as suas crises climáticas passaram a ser apontadas como causas únicas da sua pobreza; generalizou-se a idéia de que a pobreza da região era um fator natural, o que beneficiava os grupos sociais dominantes, que se aproveitavam desta idéia para tirar proveito dos problemas causados pelas secas. Daí Antônio Callado ter apelidado setores da elite nordestina como de "industriais da seca".
Estudiosos mais abstratos em seu pensamento, como os geógrafos chamados "da percepção", que não aceitam a objetividade de certos conceitos, evoluem no sentido de afirmar que não existem regiões e que elas são apenas um produto da percepção, uma produção psicológica. Entre os sociólogos e economistas existem os que afirmam que o capitalismo anula as diversificações regionais e que a região é uma categoria morta.
Há, ainda, os mais radicais que afirmam ser o Nordeste um produto da Revolução de 30, criado como forma de pressão dos grupos dominantes, sequiosos por recursos; isto porque antes não se falava em Nordeste, e o país era dividido apenas em duas regiões: a Norte e a Sul. O Nordeste seria apenas Norte. Ao fazerem tal afirmação, os seus partidários admitiram, naturalmente, que a região era uma realidade imutável, esquecendo que na sua formação havia também a contribuição do homem, organizando o espaço geográfico; esquecendo que nada é imutável e que há até transformações dos domínios físicos e do meio biológico, como se observa atualmente com as mudanças climáticas. Esqueciam também que o conhecimento científico evolui, muda, trazendo modificações conceituais; daí não termos dúvidas da existência do Nordeste como região, ocupando um espaço no território brasileiro e, naturalmente, sofrendo transformações a curto e longo prazos.

Fonte: http://www.fundaj.gov.br/observanordeste/obed001c.html

Nordeste, nordestes, que nordeste ?

Nordeste, Nordestes: Que Nordeste?[1]
Tânia Bacelar de Araújo / Economista e professora do Departamento de Economia da UFPE

1. Introdução
Este trabalho enfoca a trajetória recente, as características atuais e as perspectivas das atividades econômicas desenvolvidas na região Nordeste do Brasil e sua inserção no contexto nacional. Destaca, também, alguns efeitos sociais das mudanças recentes.
O Nordeste aqui considerado inclui os estados que vão do Maranhão à Bahia[1] e o período de análise se estende dos anos 60 até 1992.
Apresenta-se uma sucinta descrição da dinâmica geral das atividades econômicas do Nordeste, verificando também o papel que elas desempenharam nos grandes movimentos da economia nacional, desde a fase do chamado “milagre brasileiro” (1968-73), passando pela desaceleração da segunda metade dos anos 70, até a fase de crise e instabilidade, com predomínio da acumulação financeira, dominante nos anos 80 e no início dos 90. Até aí a região será abordada em seu conjunto, utilizando-se, portanto, dados globais, referentes, em sua grande maioria, ao total regional.
Num segundo momento, busca-se avançar na percepção das diferenciações existentes dentro da própria região Nordeste, destacando-se os novos subespaços dinâmicos, as diferentes trajetórias estaduais e metropolitanas, e os focos de resistência a mudanças. A heterogeneidade e a complexidade da dinâmica nordestina aparecerão, nesse instante, com maior clareza.
Uma outra seção será dedicada à observação das articulações econômicas regionais e sub-regionais mais importantes. O Nordeste e seus subespaços serão percebidos, então, em suas tendências de ligações com o exterior e com as demais regiões do próprio Brasil.
A dimensão social e a persistência da pobreza na região serão também analisadas, considerando-se o contexto nacional e as diferenciações internas à região.
Ao longo do trabalho, busca-se destacar, sinteticamente, as constatações mais relevantes, as tendências mais marcantes e as questões que elas suscitam, inclusive para a discussão da Federação brasileira. O papel das políticas públicas será obviamente tratado com particular interesse, dada a importância que a ação estatal teve na conformação da realidade econômica regional.

2. Evolução Recente da Economia Nordestina
Na região Nordeste (20% do território brasileiro), vivem 29% da população do País, originam-se aproximadamente 14% da produção nacional total (medida pelo PIB), 12% da produção industrial e quase 21% da produção agrícola.
Cabe destacar, de início, que na região residem 23% da população urbana do Brasil e 46% de sua população rural. Este último dado contrasta com o do Sudeste, que é responsável por mais de 38% da produção agrícola do País, mas por apenas 21% da população rural nacional. O lento crescimento econômico, que durante muitas décadas caracterizou o ambiente econômico nordestino (GTDN, 1967), foi substituído pelo forte dinamismo de numerosas atividades que se desenvolvem na região, como se verá a seguir. A pobreza continua a ser uma das marcas mais importantes do Nordeste, quando vista no contexto nacional. É um traço antigo que o dinamismo econômico das últimas décadas não conseguiu alterar significativamente.
Levantamento recente do Instituto de Planejamento Econômico e Social – IPEA mostra que, em 1990, dos 32 milhões de brasileiros indigentes, 17,3 milhões estavam no Nordeste (55% do total nacional). Mais de 10 milhões residiam na zona rural da região. Assim, com 46% da população rural brasileira, o Nordeste tem 63% dos indigentes brasileiros que vivem nas áreas rurais. Dos indigentes urbanos do País, quase 46% estão no Nordeste (IPEA, 1993).

2.1 Dinâmica Geral
Coordenado por Celso Furtado, no final dos anos cinqüenta, o relatório do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), que fundamentou a estratégia inicial de ação da SUDENE, constatava que nas décadas anteriores a característica mais importante da base produtiva instalada na região era seu fraco dinamismo. Enquanto a indústria comandava o crescimento econômico no Sudeste, o velho setor primário-exportador implantado no Nordeste dava mostras de sua incapacidade para continuar impulsionando o desenvolvimento econômico.
Uma das propostas centrais do relatório do GTDN (como ficou conhecido aquele documento) era estimular a industrialização no Nordeste como forma de superar as dificuldades geradas pela velha base agroexportadora nordestina.
A partir dos anos 60, impulsionadas pelos incentivos fiscais (34/18 – Fundo de Investimento no Nordeste - FINOR e isenção do imposto sobre a renda, principalmente), por investimentos de empresas estatais do porte da PETROBRÁS (na Bahia) e da Vale do Rio Doce (no Maranhão), complementados com créditos públicos (do Banco Nacional de Desenvolvimento - BNDES e Banco do Nordeste do Brasil - BNB, particularmente) e com recursos próprios de importantes empresas locais, nacionais e multinacionais, as atividades urbanas (e dentro delas, as atividades industrias) ganham crescentemente espaço no ambiente econômico do Nordeste e passam a comandar o crescimento da produção nessa região brasileira, rompendo a fraca dinâmica preexistente. Entre1967 e 1989, a agropecuária reduziu sua contribuição ao PIB regional de 27,4% para 18,9%, sendo que, em 1990 (ano da seca, que afetou consideravelmente a produção da zona semi-árida), esse percentual caiu para 12,1%. Enquanto isso, a indústria passou de 22,6% para 29,3%, e o terciário cresceu de 49,9% para 58,6%, segundo dados da SUDENE para o período.
No início dos anos 60, a SUDENE, recém-criada, concentrou esforços e recursos federais na realização de estudos e pesquisas sobre a dotação de recursos naturais do Nordeste (em particular de recursos minerais) e na ampliação da oferta de infra-estrutura econômica (transportes e energia elétrica, sobretudo). Tais investimentos tiveram um papel importante para o posterior dinamismo dos investimentos nas atividades privadas, tanto no setor industrial como no setor terciário.
No global, nas décadas dos 60, 70 e 80, o Nordeste foi a região que apresentou a mais elevada taxa média de crescimento do PIB, no Pais. De 1960 a 1988, a economia nordestina suplantou a taxa de crescimento média do País em cerca de 10%; e entre 1965 e 1985, o PIB gerado no Nordeste cresceu (média de 6,3% ao ano) mais que o do Japão no mesmo período (5,5% ao ano) (Maia Gomes, 1991).
A comparação do ritmo de crescimento da produção no Nordeste com o do País mostra claramente que o comportamento prevalecente até os anos 50 não se reitera nas décadas seguintes. Nos anos 60 e 70, as atividades produtivas do Nordeste acompanharam o ritmo de crescimento da produção nacional e, na última década, apresentaram dinamismo superior à média brasileira (Guimarães Neto e Araújo, 1991).
Usando dados da Fundação Instituto Brasiliero de Geografia e Estatística - IBGE e da SUDENE, e comparando o desempenho da economia brasileira no seu total com o de sua parte localizada no Nordeste, Duarte (1989) verifica uma nítida melhoria nos indicadores de participação relativa do Nordeste na economia do País: entre 1970 e 1987, a participação no PIB aumentou de 12,6% para 15,8%; a relação do PIB per capita nordestino com o valor médio do País passou de 45,8% para 54,4%; o peso na produção industrial foi de 9,6% para 10,5%; e na produção terciária, de 12,4% para 15,8%. Além disso, a participação no valor do ICMS arrecadado por todos os estados do Nordeste no total brasileiro cresceu de 9,2% (em 1975) para 12,5% em 1987 (Duarte, 1989).
Apenas no caso da agropecuária, a importância relativa do Nordeste declinou de 22,5%, em 1970, para 19% em 1990, uma vez que outras regiões, especialmente o Centro-Oeste, apresentaram maior dinamismo.
No total, entre 1960 e 1990, o PIB do Nordeste quase sextuplicou, passando de US$ 8,6 bilhões para US$ 50 bilhões (Araújo, 1992).
Cabe salientar que, quando se compara o desempenho das atividades econômicas do Nordeste com a média nacional, verifica-se que a dinâmica regional tendeu a acompanhar as oscilações cíclicas da produção total do País. No “milagre econômico”, o dinamismo nacional se estendeu ao Nordeste: o PIB regional cresceu 7% em termos reais, entre 1967 e 1973, quando a média do País foi 11%.
Quando, após o primeiro choque do petróleo, a economia brasileira desacelerou, descendo de um patamar de crescimento de 11% ao ano para pouco menos de 7% (entre 1974 e 1980), as atividades econômicas implantadas no Nordeste cresceram 7,4% no período.
Já nos anos 80, quando a produção nacional apresentou desempenho ainda mais modesto, a produção nordestina, embora tendo declinado menos que a de outras regiões (especialmente se comparadas suas atividades industriais às do Sudeste), não destoou do padrão nacional.
No início dos anos 90, o aprofundamento da recessão promovido no Governo Collor afetou no mesmo sentido o Brasil e o Nordeste.
O movimento de integração econômica comandado pelo processo de acumulação de capitais do País nas últimas décadas havia, portanto, atingido o Nordeste e “solidarizado” sua dinâmica econômica às tendências gerais da economia nacional, como ressaltaram em seus estudos Oliveira (1990) e Guimarães Neto (1989). Dessa perspectiva e nesse novo momento, uma das teses centrais do GTDN ficou ultrapassada: não se verifica mais o fato de a economia do Nordeste, mergulhada na estagnação, conviver com o forte dinamismo do Centro-Sul. A integração articulou as diversas dinâmicas “regionais”.
Naturalmente, a integração econômica não homogeneizou as estruturas produtivas das diversas regiões do País. Permaneceram diferenciações importantes.
E é justamente em função das particularidades das estruturas produtivas de cada região brasileira que o Nordeste é menos atingido na crise dos anos recentes. A crise tem afetado mais fortemente o setor industrial e, dentro dele, os segmentos produtores de bens de capital e bens de consumo duráveis. Ora, tais segmentos não têm grande presença no tecido industrial do Nordeste (como foi o caso de Manaus, que se especializou na produção de bens duráveis e está sendo duramente atingida pela crise). Assim, ao se especializar mais na produção de bens intermediários, destinando parte importante às exportações, a indústria recentemente instalada no Nordeste resiste melhor aos efeitos da recessão brasileira. Paralelamente, em sua porção oeste e nas margens do submédio São Francisco, o Nordeste implantou moderna agricultura de grãos e importante pólo de fruticultura, ambos para exportação, o que o ajuda a resistir aos efeitos da retração da demanda interna, podendo localizadamente enfrentar melhor a crise nacional. Conforme dados da SUDENE (1992), também o setor dos serviços tem tido desempenho bastante razoável no Nordeste, especialmente a partir da segunda metade dos anos 80, apresentando taxas de crescimento anual positivas e superiores à média do País.

2.2. O Nordeste e as Tendências da Economia Nacional
A partir do dinamismo verificado na base econômica do Nordeste, mesmo considerando a desaceleração resultante dos impactos da crise nacional, a economia da região promoveu mudança importante na composição de sua produção. Ela acompanha, também, nesse ponto, as tendências gerais da economia brasileira, apesar das particularidades locais.
Assim, dos anos do “milagre econômico” até o início da presente década, as atividades agropecuárias perderam peso relativo no PIB do Brasil e também no do Nordeste. As atividades urbanas avançaram mais nos dois casos, embora a indústria tenha se tornado relativamente mais importante no total da produção brasileira (34%, em 1990) do que no Nordeste (30%).
Com isso, quando visto no ambiente econômico nacional, o Nordeste continua sendo relativamente mais importante como região produtora agropecuária (20% do total nacional) do que industrial (12%) ou terciária (15%), segundo dados da SUDENE para 1990 (SUDENE, 1992).[2]
Contudo, mudanças ocorreram no perfil produtivo da agropecuária nordestina. A partir dos anos 70, enquanto se reduzia a área cultivada com algodão, mamona, mandioca, sisal, expandia-se a área ocupada com cana-de-açúcar, arroz, cacau, feijão, laranja e milho. Ao mesmo tempo, algumas culturas não tradicionais na região, pelo valor de mercado relativamente alto que possuem, apresentaram peso crescente na produção regional: é o caso de frutas como mamão, manga, melancia, uva (nas áreas irrigadas pelo São Francisco), do cacau e abacaxi (em manchas favoráveis do sertão e agreste) e do tomate, café, soja e borracha (em áreas favoráveis do São Francisco, do agreste, do cerrado e da Zona da Mata, respectivamente). Esses produtos representavam, em 1970, apenas 3% do valor da produção agrícola do Nordeste, crescendo seu peso para 13,5% em 1989 (Congresso Nacional, 1993).
Nos anos em que a economia brasileira consolida o mercado interno nacional e promove sua integração produtiva, o Nordeste “engata” na dinâmica nacional, como foi anteriormente ressaltado. Nessa fase, capitais privados buscam novas frentes de investimento em espaços que se situem para além do centro mais industrializado do País, o Sudeste. Verifica-se uma desconcentração da atividade produtiva no País, inclusive da atividade industrial. E esse movimento atinge também o Nordeste (Guimarães Neto, 1990; FUNDAJ, 1992; Oliveira, 1990, dentre outros). Como esse movimento de desconcentração busca predominantemente utilizar recursos naturais disponíveis nas diversas regiões do País, o Nordeste comparece, abrigando alguns pólos importantes de desenvolvimento agroindustrial e industrial, que serão analisados com detalhes mais adiante, quando se examinarem os focos de modernidade surgidos na região nas últimas décadas (item 3.1). No caso da indústria, coube ao Nordeste assumir um novo papel no contexto da divisão inter-regional do trabalho do País. De tradicional região produtora de bens de consumo não-duráveis (têxtil e alimentar, principalmente), vai-se transformando, nos anos pós-60, numa região industrial mais especializada em bens intermediários (Araújo, 1981), com destaque para a instalação do pólo petroquímico de Camaçari, na Bahia, e do complexo minero-metalúrgico, no Maranhão, sem falar do pólo de fertilizantes de Sergipe, do complexo da Salgema em Alagoas, da produção de alumínio no Maranhão, dentre outros.
Nesse contexto, o perfil industrial do Nordeste vem mudando muito, com a perda de posição relativa da indústria de bens não-duráveis de consumo e o crescimento relativo do segmento voltado à produção de bens intermediários, devido ao papel que a região assume no conjunto da indústria nacional. A “nova” indústria financiada pelos incentivos da SUDENE tem esse perfil: foram os segmentos produtores de insumos que receberam a maior parte dos recursos provenientes do sistema 34/18-FINOR.
A nova base agrícola da região também tem essa “vocação” para a produção de produtos cujo beneficiamento se dará fora do Nordeste e, em alguns casos, fora do País. Salvo em casos como o das frutas tropicais, enviadas “in natura” para o mercado consumidor externo, ou da uva, transformada em vinho também no Nordeste, ou do farelo de soja, parte importante da produção agrícola e mineral da região é vendida para ser transformada fora.
Nos anos 70, quando o Estado brasileiro, a partir da estratégia definida no II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), realizou importante programa de investimentos públicos e, com ele, sustentou a dinâmica da economia nacional num contexto internacional de crise, o Nordeste também se incluiu nessa tendência. Nesse momento, a PETROBRÁS comandou, na Bahia, a implantação do pólo petroquímico de Camaçari. A Cia. Vale do Rio Doce implementou o complexo de Carajás, com parte dos investimentos localizando-se no Maranhão. Merecem também referência os investimentos do sistema ELETROBRÁS.
No total da formação bruta de capital fixo, contabilizada pelo IBRE/FGV, que inclui investimentos da Administração Pública e das empresas do Governo, verifica-se que a posição do Nordeste como região recebedora de recursos passou de 13% do total nacional em 1970 para 17% em 1985.
Finalmente, nos anos 80, quando a crise brasileira se aprofundou, excluindo de seus efeitos negativos as atividades de intermediação financeira e os segmentos voltados para a exportação, o Nordeste tendeu a reproduzir esse padrão. Entre 1975 e 1990, o Brasil expandiu suas exportações, mais que triplicando-as: passam de US$ 7,6 bilhões de vendas anuais para US$ 31,1 bilhões. O Nordeste também produziu mais para o exterior, duplicando seu valor exportado que passou de US$ 1,5 bilhão, em 1975, para US$ 3 bilhões, em 1990. Dentro dele, o Estado da Bahia merece referência especial não só porque acompanhou o padrão nacional, triplicando seu valor exportado (de US$ 525 milhões para US$ 1,5 bilhão), mas porque aumentou sua já predominante importância no total vendido pela região no mercado internacional: em 1975, sua economia gerava um terço das exportações nordestinas; em 1990 respondia pela metade do valor exportado por essa região.
No que se refere às atividades de intermediação financeira, elas também tiveram um crescimento excepcional no Nordeste, nas décadas recentes. Enquanto a economia brasileira desacelerou, entrando numa fase recessiva, a intermediação financeira cresceu. No Nordeste também se observa a mesma tendência. Enquanto nos anos 70 e 80, a economia na região cresceu em média 7,6% ao ano, as atividades financeiras, bens imóveis e serviços às empresas, como contabiliza a SUDENE (1992), se expandiram a 10% ao ano.
Como se observa do exposto, as atividades econômicas do Nordeste tendem a acompanhar, no geral, bem de perto as principais tendências da economia brasileira. Guardam, no entanto, certas especificidades importantes, algumas das quais aparecerão com destaque na seção seguinte.
Uma das características especiais da economia do Nordeste é o relevante papel desempenhado nos anos recentes pelo setor público. Claro que em todas as regiões brasileiras o Estado patrocinou fortemente o crescimento econômico. Porém, no Nordeste, pode-se afirmar que sua presença foi o fator determinante da intensidade e dos rumos do dinamismo ocorrido nas últimas décadas. Direta ou indiretamente, foi o setor público quem puxou o crescimento das atividades econômicas que mais se expandiram na região, nos anos 70 e 80, segundo dados da SUDENE (1992): bens imóveis e serviços às empresas; atividades financeiras; produção de energia elétrica e abastecimento de água; serviços comunitários sociais e pessoas; e comércio. Juntas, essas atividades somam dois terços do PIB regional. Em muitas delas, o investimento público foi fundamental. Aliás, o setor público tem no Nordeste um peso maior na formação bruta de capital fixo total do que na média nacional. Investindo, produzindo, incentivando, criando infra-estrutura econômica e social, o Estado se faz presente com grande intensidade na promoção do crescimento da economia nordestina.

3. Heterogeneidade Econômica Intra-Regional: Modernização Intensa vs. Estruturas Tradicionais
Nos anos recentes, movimentos importantes da economia brasileira tiveram repercussões fortes na região Nordeste. Tendências da acumulação privada reforçadas pela ação estatal, quando não comandadas pelo Estado brasileiro, fizeram surgir e desenvolver no Nordeste diversos subespaços dotados de estruturas econômicas modernas e ativas, focos de dinamismo em grande parte responsáveis pelo desempenho relativamente positivo apresentado pelas atividades econômicas na região. Tais estruturas são tratadas na literatura especializada ora como “frentes de expansão”, ora como “pólos dinâmicos”, ora como “manchas ou focos” de dinamismo e até como “enclaves”. Dentre eles, cabe destaque para o complexo petroquímico de Camaçari[3], o pólo têxtil e de confecções de Fortaleza[4], o complexo minero-metalúrgico de Carajás[5], no que se refere a atividades industriais, além do pólo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro (com base na agricultura irrigada do sub-médio São Francisco), das áreas de moderna agricultura de grãos (que se estendem dos cerrados baianos atingindo, mais recentemente, o sul dos Estados do Maranhão e Piauí), do moderno pólo de fruticultura do Rio Grande do Norte (com base na agricultura irrigada do Vale do Açu), do pólo de pecuária intensiva do agreste de Pernambuco, e dos diversos pólos turísticos implantados nas principais cidades litorâneas
do Nordeste.
Pesquisa recente dos professores Policarpo Lima e Fred Katz, da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, identificou melhor essas áreas, caracterizando-as e analisando seus novos impactos e suas perspectivas de expansão (Lima e Katz, 1993). Menos por seu dinamismo e mais pelo fato de desenvolverem modernas atividades de base tecnológica, merecem referência ainda os tecnopólos de Campina Grande (PB) e Recife (PE).

3.1. Permanência de Estruturas Tradicionais
Ao mesmo tempo em que diversos subespaços do Nordeste desenvolvem atividades modernas, em outras áreas a resistência à mudança permanece sendo a marca principal do ambiente sócio-econômico: as zonas cacaueiras, canavieiras e o sertão semi-árido são as principais e históricas áreas desse tipo. Quando ocorre, a modernização é restrita, seletiva, o que ajuda a manter um padrão dominantemente tradicional. As zonas canavieiras expandiram-se muito, impulsionadas nos anos 70 pelo PROÁLCOOL, que traz consigo a alternativa da produção de um energético para o mercado interno (o álcool). Mas o crescimento se faz com base na incorporação de terras (a área cultivada rapidamente duplica), mais do que na elevação dos padrões de produtividade.
No caso do semi-árido, a crise do algodão (com a presença do bicudo e as alterações na demanda, no padrão tecnológico e empresarial da indústria têxtil modernizada na região) contribui para tornar ainda mais difícil e frágil a sobrevivência do imenso contingente populacional que habita os espaços dominados pelo complexo pecuária/agricultura de sequeiro. No “arranjo” organizacional local, o algodão era a principal (embora reduzida) fonte de renda monetária dos pequenos produtores e trabalhadores rurais desses espaços nordestinos. Na ausência do produto, esses pequenos produtores são obrigados a levar ao mercado o pequeno excedente da agricultura alimentar tradicional de sequeiro (milho, feijão e mandioca), uma vez que a pecuária sempre foi atividade privativa dos grandes proprietários locais.
Não é sem razão que, nos momentos de irregularidade de chuvas, ocorridos nos anos recentes, as tradicionais “frentes de emergência” (como são chamados os programas assistências do Governo) alistam número enorme de agricultores (2,1 milhões de pessoas em 1993). Nessas áreas, nos anos de chuva regular, os pequenos produtores, rendeiros e parceiros produzem, mas não conseguem acumular: descapitalizados ao final de cada ciclo produtivo, são incapazes de dispor de meios para enfrentar um ano seco. Nesse quadro, portanto, não houve mudanças significativas, e as que aconteceram, em geral, tiveram impactos negativos, como o desaparecimento da cultura do algodão. De positivo, a extensão da ação previdenciária, cobrindo parte da população idosa e assegurando uma renda mínima, mas permanente, a muitas famílias sertanejas.
Nas áreas cacaueiras, a resistência à mudança convive na fase mais recente com importante queda nos preços internacionais do cacau, aprofundando a crise nessa sub-região.
Nas áreas em que predominam a rigidez das velhas estruturas econômico-sociais e o domínio político das oligarquias tradicionais da região, há traços comuns importantes. Primeiro, cabe destacar que são áreas de ocupação antiga, nas quais as velhas estruturas foram criando sucessivos mecanismos de preservação. A questão fundiária é mais dramática e vem-se agravando. Na Zona da Mata, por exemplo, o processo de concentração fundiária tem aumentado nos anos recentes, e o monopólio da cana sobre as áreas cultiváveis se ampliou. No semi-árido, das secas também resulta o agravamento da já elevada concentração das terras em mãos de pouquíssimos produtores: “na seca, pequenos proprietários inviabilizados vendem suas terras a baixos preços e os latifúndios crescem”, como bem explica Andrade (1986). Simultaneamente, os incentivos à pecuária fortaleceram e modernizaram essa que sempre foi a atividade principal da unidade produtiva típica do sertão e do agreste nordestino. A hegemonia crescente da pecuária nos moldes em que foi realizada agravou a questão fundiária do Nordeste, além de provocar outros efeitos importantes, como a redução da produção de alimentos e a intensificação de emigração rural. Na sábia afirmação do geógrafo Melo (1980), “o capim expulsa a policultura alimentar e o gado tange o homem”. Mesmo onde a irrigação introduziu uma agricultura moderna no semi-árido, a “modernização” foi conservadora, inclusive da estrutura fundiária. A base técnica modernizou-se, a questão fundiária agravou-se (Graziano da Silva, 1989).
Como a estratégia brasileira das últimas décadas foi concentrar a expansão da agropecuária em áreas novas (especialmente no Centro-Oeste), no Nordeste também se assistiu a um grande dinamismo agropecuário e agroindustrial no oeste baiano e no sul do Maranhão e Piauí; portanto, em áreas da antiga “fronteira agrícola” da região. Nos anos 60 e seguintes, a proposta da reforma agrária foi abandonada na prática pelos sucessivos governos militares e civis, e apresentada ao País como desnecessária em muitos fóruns (inclusive nos acadêmicos) com base no “sucesso” da ocupação de novas terras. As oligarquias nordestinas, proprietárias das áreas de antiga ocupação e sempre bem situadas nas estruturas de poder, continuavam a beneficiar-se dessa macroopção.
E, após tantos anos de dinamismo econômico, a questão fundiária permanece praticamente intocada, apesar da miséria alarmante dominante nas áreas rurais do Nordeste. Segundo o Mapa da Fome feito recentemente pelo IPEA, dois terços dos indigentes rurais do País estão no Nordeste.
A concentração fundiária aumentou no Nordeste nas últimas décadas. Em 1970, os estabelecimentos com menos de 100 hectares (94% do total) ocupavam quase 30% da área; em 1985, essa participação caiu para 28%. Ao mesmo tempo, os estabelecimentos de mais de mil hectares (0,4% do total) aumentaram sua participação na área total, passando de 27% em 1970 para 32% em 1985. Nesse período, a área total ampliou-se de 74 milhões de hectares para 92 milhões de hectares, de acordo com os censos agropecuários realizados pela Fundação IBGE.
Na zona semi-árida, onde se reproduz a estrutura desigual do resto do Nordeste, a situação é agravada pela presença de “latifúndios maiores”: lá a área média do 1% dos maiores estabelecimentos (1.914 hectares, em 1985) é superior ao tamanho médio desses estabelecimentos no resto do Nordeste (1.002 hectares). No semi-árido, o acesso à terra é feito por formas precárias (parceria, por exemplo), caracterizando maior instabilidade, e se registra maior presença de grandes posseiros em comparação com o resto do Nordeste (Graziano da Silva, 1989).
Nesses espaços como foi visto, as velhas estruturas sócio-econômicas e políticas têm na base fundiária um de seus principais pilares de sustentação.

3.2. Diferentes Trajetórias Estaduais e Metropolitanas
De início, deve-se ressaltar que nunca houve um Nordeste economicamente homogêneo[6] e que, historicamente, era possível destacar pelo menos três subconjuntos sócio-econômicos característicos, em virtude de diferentes processos de ocupação:
· O “Nordeste” que se estendia do Rio Grande do Norte até Alagoas, onde a economia açucareira e a pecuária gestavam duas poderosas oligarquias e uma incipiente burguesia industrial. Dele já se distinguia o Ceará, onde o complexo gado/algodão/agricultura de alimentos conformava uma oligarquia sertaneja que se expandia na acumulação comercial, e onde não existia o complexo canavieiro;
· O “Nordeste” de Sergipe e Bahia é comandado por Salvador, cidade portuária e mercantil, onde desde cedo se desenvolveu uma burguesia banqueira. No interior, a cana, o cacau e as zonas sertanejas dominavam. O oeste baiano era um vazio econômico e mesmo demográfico, até décadas recentes;
· O “Nordeste” do Piauí e Maranhão, mais conhecidos como espaço de transição entre o Nordeste seco e a região amazônica, era chamado por alguns estudiosos de “meio norte”, e visto como área aberta à expansão da fronteira agrícola regional.
Como já sublinhamos, a heterogeneidade cresceu nas últimas décadas. A existência, em vários estados, de focos modernos convivendo ou não com estruturas econômicas tradicionais termina por definir diferentes trajetórias nas dinâmicas econômicas locais. Entre 1970 e 1990, algumas economias estaduais ganharam importância no conjunto da base produtiva instalada no Nordeste (com destaque para o Rio Grande do Norte, Ceará e Maranhão), enquanto as principais economias estaduais perderam posição relativa, tal é o caso da Bahia e especialmente de Pernambuco.
Ate mesmo as três regiões metropolitanas (Fortaleza, Recife e Salvador), embora submetidas ao movimento mais geral de intensa urbanização e de uma industrialização que as articula inclusive com outros espaços industriais do País, apresentam particularidades
A política governamental aportava elementos unificadores, ao mesmo tempo em que processos gerais, como o de oligopolização, bem estudado por Oliveira (1981), também introduziam elementos comuns às diversas realidades locais. Usando uma amostra representativa de empresas instaladas no Nordeste com os incentivos governamentais, Oliveira (apud Carvalho, 1989) constata que, em 20 subsetores industriais, as quatro maiores empresas concentravam mais de 50% do faturamento de seu subsetor. Além disso, 610 empresas, pertencentes a grupos econômicos, respondiam por quase 80% do faturamento total e do patrimônio líquido do universo pesquisado.
Mas as estruturas preexistentes, a dotação de recursos locais e mesmo o perfil empresarial dominante, dentre outros elementos, tiveram papel diferenciador.
No Ceará, por exemplo, pesquisa recente da SUDENE-BNB revela que na montagem do novo pólo têxtil e de confecções há uma forte articulação entre os capitais locais e os capitais de fora, que se dirigem a Fortaleza na esteira dos benefícios fiscais e financeiros federais. Esse fato se confirma pelos dados da participação de capitalistas locais com 88% do capital integralizado pelos acionistas portadores de ações ordinárias nas empresas financiadas pela SUDENE. Esse percentual é inferior a 34% nos casos de Pernambuco e da Bahia, onde portanto predomina largamente capital extra-regional. Nesses estados, a articulação entre capitalistas locais e extra-regionais é bem menor; e, por isso, Pernambuco e Bahia recebem, majoritariamente, filiais de empresas de outras regiões ou países, comandadas de fora.[7].
Por outro lado, o complexo industrial moderno implantado em Fortaleza guarda estreita ligação com a base industrial preexistente, por estar fundado em atividades tradicionais da indústria nordestina: a têxtil e a confecção. Neste último caso, o novo segmento produtor de confecções tem por trás toda uma tradição do artesanato local (as rendeiras cearenses.
No caso do Recife, a região metropolitana amplia e diversifica sua base industrial com a presença de setores que não tinham grande tradição em Pernambuco, como é o exemplo da produção de material elétrico. Embora continue tendo a segunda maior base industrial da região, o Estado de Pernambuco perdeu posição relativa no contexto nordestino, principalmente para Bahia, Maranhão e Ceará, entre 1965 e 1985, especialmente.
O Estado não dispunha, nesse período, de uma base de recursos naturais importante para participar do movimento nacional de desconcentração industrial, fundado na implantação de plantas produtoras de insumos (calcadas geralmente num recurso mineral abundante no local). Ao mesmo tempo, perde para o Ceará o essencial do moderno parque de fiação e numerosos estabelecimentos de tecelagem e confecções. Um diferencial introduzido pela adoção de um sistema de “faixas” (com tratamento privilegiado à faixa A, que excluía Recife) na política de incentivos administrada pela SUDENE (entre 1969 e 1985) dificultava a localização dessas indústrias na Região Metropolitana do Recife.
Em função dessas dificuldades, Pernambuco declinou sua participação na indústria de transformação do Nordeste, passando de 35% do total regional, em 1970, para 24%, em 1985 (SUDENE, 1992).
Também nas últimas décadas, à medida que avança o processo de integração produtiva no Brasil, que o mercado interno consolida sua estruturação em bases crescentemente nacionais, que as ligações rodoviárias e as modernas telecomunicações aumentam a acessibilidade entre pontos distantes do território nacional, vai perdendo importância um tradicional papel da Região Metropolitana do Recife: o de pólo intermediador, de entreposto atacadista. Tal fato tem efeitos negativos sobre a atividade comercial dessa área urbana.[8]
Nos anos mais recentes, o dinamismo do terciário nessa metrópole reflete seu potencial para abrigar atividades modernas do setor de serviços: serviços médicos especializados, serviços de consultoria, propaganda, “marketing”, seguros, etc., além do crescimento das atividades de intermediação financeira.
A Região Metropolitana de Salvador também apresenta particularidades em sua dinâmica recente. Os efeitos indiretos do pólo petroquímico de Camaçari transbordam para a principal área metropolitana do Nordeste. Outros setores industriais são expandidos e modernizados, como o metalúrgico, embora a química seja a grande marca do tecido industrial local. A expansão de importantes empresas do setor da construção civil é muito mais nítida em Salvador que nas demais cidades nordestinas. A modernização da agricultura baiana exerce papel complementar, uma vez que transfere renda para Salvador. A cidade desenvolveu-se muito e há grande dinamismo na expansão de seu capital imobiliário. Ao mesmo tempo, em especial nos anos 80, o setor financeiro, presença tradicional nessa área metropolitana, mostra forte crescimento, e Salvador se beneficia disso.
A observação do ritmo de crescimento das bases produtoras dos diversos estados nordestinos revela a existência de distintas trajetórias, algumas mais dinâmicas que outras. Nos pequenos estados de Sergipe, Rio Grande do Norte e Alagoas, a produção industrial ganhou forte relevância, representando, em 1990, entre 34% (Alagoas) e 40% (Sergipe e Rio Grande do Norte) de suas respectivas produções totais. Nos principais estados do Nordeste, a atividade industrial representava em torno de 28% do PIB estadual, em 1990.
No que se refere às atividades terciárias, há uma tendência predominante ao aumento do seu peso relativo nas respectivas economias estaduais, sendo esse movimento mais intenso nos casos do Maranhão e da Bahia. Diferem da tendência geral Sergipe e Rio Grande do Norte, onde o peso relativo do terciário declinou de 54% para 45% e de 55% para 54%, nas respectivas bases econômicas estaduais, entre 1970 e 1990.
No Estado do Maranhão, o terciário pesa relativamente mais (64%); em Sergipe, pesa menos (45%), sendo a média regional de 58,6%, em 1990, segundo dados da SUDENE.
Na agricultura, a seca continua sendo elemento unificador. Na estiagem do início dos anos 80 (1981-83), a produção agrícola apresentou retração generalizada, com exceção do caso baiano (o dinamismo agroindustrial do oeste compensou os efeitos negativos da seca que ocorreu a leste do Rio São Francisco).
A dinâmica geral dos diversos estados foi bastante diferenciada no período 1970-92, segundo dados da SUDENE. Tanto em termos do PIB total como per capita, os melhores desempenhos foram apresentados pelo Rio Grande do Norte, Maranhão e Ceará. Considerando a variação do PIB total, o crescimento mais lento foi apresentado pelas economias de Pernambuco e Paraíba. Em termos per capita, a Bahia e novamente Pernambuco foram os estados com variação menor ao longo do período.
Finalmente, cabe destacar que, acompanhando a tendência da região, a maioria dos estados ganhou posição relativa na produção do pais, nas duas últimas décadas. Esse fato só não ocorreu nos casos da Paraíba, Pernambuco e Alagoas, e foi mais evidente para o caso da Bahia, que elevou de 3,8% para 5,2% sua importância relativa no PIB brasileiro, entre 1970 e 1985.

4. Articulações Econômicas Regionais e Sub-regionais
Busca-se examinar aqui as articulações econômicas estabelecidas entre as sub-regiões nordestinas (prioritariamente as que experimentaram maior dinamismo nas últimas décadas), outras regiões brasileiras e o resto do mundo.

4.1. Ligações Econômicas do Novo Parque Industrial
O novo parque industrial, instalado a partir dos anos 60 com o apoio dos incentivos federais,[9] mantém estreitas articulações econômicas com outras regiões brasileiras, mais particularmente com o Sudeste.
Do ponto de vista da origem dos insumos que transforma no processo produtivo e dos serviços que utiliza, há uma relação forte com a base econômica nordestina, de onde adquire 66% das matérias-primas e 58% dos serviços que consome. A recente especialização nos bens intermediários reforça essa ligação.[10] Mas o novo parque industrial desenvolveu também importante fluxo de compras de serviços e insumos com o Sudeste (em especial com São Paulo). Dos serviços que usa, 40% vêm do Sudeste (90% desses, de São Paulo); das matérias-primas que processa, 17% são produzidas no Sudeste (2/3 em São Paulo). Do exterior, vêm apenas 10% dos insumos que aqui são transformados pela indústria incentivada (SUDENE, BNB, 1992).
No que se refere ao mercado de produtos, a relação predominantemente é extra-regional, com destaque para a região Sudeste e dentro dela para São Paulo.
Das vendas realizadas pela indústria incentivada, pouco mais de um terço se destina à própria região Nordeste (36%). O destino principal é o Sudeste, que compra 44% da produção da indústria incentivada (71% dos quais quem adquire é São Paulo). O mercado internacional participa com apenas 10% das vendas totais desse segmento da economia do Nordeste.
A predominância da produção de bens intermediários está na base dessa vocação “para fora” da nova indústria: os insumos que produz são transformados em grande parte onde se localiza a maior base industrial do País (o Sudeste).
Essa característica é ainda mais forte no segmento extrativo mineral, que destina ao mercado nordestino apenas 20% de sua produção, exportando o restante, mais uma vez predominantemente para a região Sudeste do Brasil, que comprou 53% da produção mineral da indústria instalada com os incentivos federais nas últimas décadas.
No complexo minero-metalúrgico do Maranhão, por exemplo, a prioridade à exportação é uma marca dos empreendimentos que aí se instalaram. Não é por acaso que o Projeto Grande Carajás incluiu, além da implantação da estratégica ferrovia de quase 900 Km de extensão, a construção de um porto (Ponta da Madeira, na região de São Luís do Maranhão).
Outro exemplo dessa articulação especial com o exterior é o projeto da ALUMAR, no Maranhão, planejado para produzir anualmente 3 milhões de toneladas de alumina e 500 mil de alumínio, de cuja produção atual exporta cerca de 95% (Lima e Katz, 1993).
O mercado extra-regional também prevalece fortemente como destino da produção de alguns segmentos da indústria de transformação, como é o caso de bebidas (99%), borracha (88%), couros e peles (87%), material elétrico (76%) e química (61%) (SUDENE e BNB, 1992).
Por outro lado, os equipamentos utilizados na montagem desse novo parque industrial foram importados do Sudeste (49%); e, dentro dele, especialmente de São Paulo (80%) e do exterior (33%). Apenas 10% dos equipamentos foram adquiridos das indústrias instaladas no próprio Nordeste (SUDENE e BNB, 1992).
Portanto, há novos fluxos comerciais (de mercadorias e serviços) que se intensificaram nas últimas décadas e que articulam a indústria incentivada instalada no Nordeste com outros segmentos da economia brasileira e com o exterior.

4.2. Articulações dos Modernos Pólos Agroindustriais
Os novos pólos agrícolas também têm estabelecido importantes relações econômicas extra-regionais, em particular com o mercado internacional.
A soja do oeste baiano, e agora do sul do Maranhão e Piauí, destina-se em grande parte a atender à demanda externa. Estima-se que só o oeste baiano, até 1995, produzirá 1,7 milhão de tonelada/ano, devendo destinar um milhão de toneladas de derivados ao mercado internacional (Queiroz, 1992). A produção maranhense e a piauiense também se orientam basicamente para o exterior. Essa sub-região nordestina, que vai do oeste baiano ao sul do Piauí e Maranhão, tem experimentado um processo de ocupação comandado por agentes econômicos extra-regionais e recebido capitais e capitalistas predominantemente não-nordestinos, implantando processos econômicos e construindo uma paisagem que se assemelha muito mais à macrorregião Centro-Oeste do Brasil. Suas ligações econômicas e suas semelhanças geo-sócio-econômicas com o “resto” do Nordeste são muito tênues. Até os estrangulamentos à continuidade de seu desenvolvimento são mais parecidos com os de Tocantins ou Mato Grosso do que com os do Nordeste do lado oriental do rio São Francisco: infra-estrutura de transporte, por exemplo. Aliás, dependendo da forma como se consolidará a malha de transportes nesse subespaço, sua vinculação futura com o Centro-Oeste pode-se ampliar.
Observa-se, assim, crescente integração da área com os demais espaços econômicos do País, associada à dinâmica e à lógica da acumulação nacional (Lima e Katz, 1993).
Igualmente, a produção agroindustrial, especialmente associada à irrigação, instalada tanto no Vale do São Francisco (BA e PE) como no Vale do Açu (Rio Grande do Norte), também desenvolve importantes articulações econômicas extra-regionais, em particular no que se refere ao destino de sua produção.

4.3. Mudanças nas Articulações Comerciais
O exame da dinâmica comercial da região, particularmente as relações estabelecidas com o mercado internacional, mostra que o Nordeste tentou acompanhar a tendência mais geral da economia brasileira nos anos recentes de crise, instabilidade e retração da demanda interna: ampliar suas articulações com o exterior.
Dentro da região, o Estado do Maranhão intensificou fortemente seus laços econômicos com o mercado externo, passando de um modesto valor exportado de US$ 5,7 milhões, em 1975, para US$ 443 milhões, em 1990. Os Estados do Piauí e de Sergipe quintuplicaram, no mesmo período, suas vendas ao mercado internacional, e os da Bahia e Ceará triplicaram. As exceções a esse movimento são os Estados de Alagoas e Pernambuco, que exportaram em 1990 um valor menor do que o de 1975.
Mais uma vez, seguindo a tendência geral da economia brasileira, as relações comerciais do Nordeste com o resto do mundo se dão cada vez menos através da venda dos chamados produtos básicos (conforme classificação adotada pela CACEX) e cada vez mais pela oferta de produtos semi-manufaturados e manufaturados.
Embora na pauta nordestina os produtos semi-manufaturados (30,1%) tenham tido, em 1990, maior peso relativo que o mesmo item na pauta brasileira (16,5%), o crescimento das relações com o exterior via venda de manufaturados no caso do Nordeste é notável: enquanto no total das exportações do Brasil os manufaturados passavam de um terço para pouco mais da metade (54,7%) da participação nas vendas externas, entre 1975 e 1990, na pauta do Nordeste o peso relativo dos manufaturados pulou de 12,9% para 44,9%. Apenas o Sudeste e o Sul, dentre as demais regiões, apresentaram maior especialização na venda de manufaturados (64,3% e 47,4%, respectivamente).
A região Sul é a segunda maior exportadora de bens manufaturados: 18,9% do valor total nacional, contra 8% do Nordeste e 71,8% do Sudeste.
Para avaliar os fluxos comerciais inter-regionais, e portanto visualizar melhor as tendências desse tipo de relação econômica entre o Nordeste e os demais espaços do País, as informações são muito insuficientes. O comércio por vias internas (especialmente rodovias) é predominante no Brasil, e as pesquisas disponíveis deixaram de ser atualizadas. No caso do Nordeste, a SUDENE estimou para 1980 que, das exportações totais do Nordeste, um terço se destinou ao mercado internacional e dois terços se dirigiram a outras regiões brasileiras. Desse total, 97% eram enviadas por vias internas e apenas 3% por cabotagem. Das importações totais, apenas 18% vinham do exterior e dos 82% que se originaram nas outras regiões do País, 85% chegavam por vias internas (SUDENE, 1985).
Os saldos comerciais do Nordeste têm-se mostrado historicamente positivos nas relações com o exterior e altamente negativos nas trocas inter-regionais. As importações de outras regiões (especialmente do Sudeste) eram quase cinco vezes maiores que o valor importado do exterior em 1980, enquanto as exportações para o resto do País não chegavam a representar duas vezes o valor das mercadorias mandadas para o mercado internacional.
O Nordeste surge, portanto, predominantemente como “região-mercado” (sobretudo para o Sudeste) quando visto no contexto nacional. E isso era uma tendência crescente, uma vez que nos anos 50 as compras a outras regiões representavam 1,2 vezes as vendas do Nordeste para o resto do País. No período 1975-80, essa relação havia aumentado para 2,5 vezes (SUDENE, 1985).
Os dados da SUDENE para 1980 já revelavam uma economia baiana fortemente orientada para o mercado nacional: quase 70% das vendas do Nordeste para outras regiões brasileiras tinham origem na Bahia, cuja economia representava, na época, pouco menos de 40% do PIB regional. Essa aparecia como uma tendência forte, mas recente, posto que na década anterior o Estado da Bahia representava apenas 25% nas exportações inter-regionais do País (SUDENE, 1985).
Embora com percentuais bem mais modestos, o Estado do Ceará demonstrava tendência semelhante, pois sua participação nas vendas nordestinas para o resto do Brasil passava de 3,5% em 1975 para 9% em 1980, sendo naquele ano o segundo exportador regional para o mercado nacional.
O inverso acontecia com Pernambuco, cuja participação nas exportações internacionais caiu de 30,3% para 8,4% no mesmo período (embora sua economia fosse 20% do total do Nordeste). Essa tendência era observada, com menos intensidade, para a Paraíba, Rio Grande do Norte e Alagoas. Esses quatro estados juntos representavam, em 1975, 40% das exportações por vias internas para outras regiões do País e, em 1980, apenas 16,4%. Nesse ano, sua participação conjunta no PIB regional era de 36,6%.
Como nos anos 80 as áreas dinâmicas recentemente instaladas repercutiram com maior intensidade nos espaços maranhenses, piauienses, cearenses, baianos e sergipanos, não é de esperar que as tendências de maior articulação econômica com outras regiões brasileiras tenham sido interrompidas. Ao contrário, o mais provável é que a articulação comercial dessa parte mais ocidental do Nordeste com o Centro-Oeste e com o Sudeste tenha-se ampliado, como vinha acontecendo nos anos 70.
No que se refere ao subespaço compreendido pelos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, a menor articulação comercial com o resto do País, surgida como tendência na década anterior, não parece ter sido revertida nos anos 80, à luz dos dados disponíveis sobre a composição e dinamismo de suas atividades econômicas. A hipótese que se pode avançar, nesse contexto, é de uma propensão ao “isolamento relativo” dessa porção mais oriental do Nordeste no âmbito das novas tendências da economia nacional. Caso essa inclinação ao isolamento se confirme, o problema social do grande contingente populacional que habita esses espaços estará encontrando maiores limitações para ser equacionado favoravelmente.

4.4. Integração via Movimento do Capital Produtivo
O movimento do capital produtivo, por sua vez, ao se intensificar no espaço do Brasil ao longo das últimas décadas, também atinge o Nordeste. Celso Furtado, no relatório que precedeu à criação da SUDENE, analisou corretamente que um dos problemas nordestinos, nos anos 40 e 50, era a forte emigração de capital produtivo em direção ao Centro-Sul, à medida que o dinamismo industrial daquela região abria oportunidades para rentáveis investimentos (GTDN, 1967). A partir dos anos 60, a intensificação rápida do movimento de oligopolização da economia brasileira e o papel de “correia de repasse” desempenhado pelos incentivos federais aplicados no Nordeste – como chama Oliveira (1981) – atuaram no sentido de alterar a orientação desse fluxo econômico, invertendo-o.
Ocorre o que alguns autores chamam de “regionalização” do grande capital (privado e estatal) que se faz agora presente nas diversas regiões do País, inclusive no Nordeste (Brando, 1985).
A crescente presença de grandes grupos empresariais no Nordeste, como em outras regiões, não se restringe ao setor industrial. Também na construção civil (impulsionada pelo Sistema Financeiro da Habitação – SFH e por programas de obras públicas importantes) e nos complexos agroindustriais (ligados especialmente à produção de grãos, frutas, cana-de-açúcar e pecuária), sua recente presença é marcante. Paralelamente, também na atividade comercial o capital se centraliza, a oligopolização se firma e grandes cadeias de magazines, supermercados etc. se fazem presentes nas diversas regiões do País e inclusive no Nordeste.[11]
Entre 1975 e 1990, o Nordeste aumentou sua participação (de 12% para 18%) no número de unidades produtivas das cinco mil maiores empresas do País. Essa participação cresceu mais na atividade agropecuária (de 12% para 37%), na mineração (de 11% para 19%), nos serviços em geral (de 6% para 12%) e nos serviços de transportes e armazenagem (de 3,5% para 6%) (Guimarães Neto, 1993).
Cabe destacar, no entanto, que a presença na região do grande capital é muito seletiva, tanto espacialmente como nas atividades econômicas para onde se dirigiram. Dados das mil maiores empresas do País mostram que, em 1990, Bahia (46%), Pernambuco (18%) e Ceará (11%) concentravam a maior parte (75%) dessas empresas.[12] Do ponto de vista setorial, a indústria de transformação produtora de bens intermediários, em especial a indústria química, tem destaque na atração desse tipo de empresas. “Das 105 grandes empresas sediadas na região, cerca de 35 são empresas industriais produtoras de bens intermediários e dessas, 23 são indústrias químicas” (Guimarães Neto, 1993). Outros segmentos que merecem referência são as indústrias de alimentos e as dedicadas à produção têxtil.
Outro aspecto relevante a destacar diz respeito ao controle do capital no moderno segmento industrial instalado no Nordeste com o apoio dos incentivos federais. Dados disponíveis em pesquisa recente (SUDENE-BNB, 1992) mostram que a expansão industrial recente não é produto da ação de investidores regionais que, contando com o apoio dos incentivos, diversificaram sua produção, ampliaram ou modernizaram suas empresas ou abriram novas unidades produtivas. Ao contrário, a maioria das empresas incentivadas fazia parte de grupos econômicos (regionais ou não). Além disso, a pesquisa constatou que os grupos extra-regionais dirigem e controlam os empreendimentos de maior porte da indústria incentivada. Os empresários nordestinos concentram seu controle sobre os empreendimentos de menor porte e destinados a produzir bens de consumo não-duráveis. Mas, na produção de bens intermediários e bens de consumo duráveis, é grande o controle do capital por grupos privados ou por sistemas de empresas estatais, com sede no Sul e Sudeste (Guimarães Neto e Galindo, 1992).
Portanto, a articulação inter-regional via fluxo de capital produtivo ligou mais o Nordeste a outras regiões do País nas últimas décadas.

5. Dimensão Social e Persistência da Pobreza
Como no Brasil, no Nordeste a evolução dos principais indicadores sociais revela que nas duas últimas décadas houve melhoria nos níveis gerais de vida, principalmente nos anos 70, mas essa melhora se deu num ritmo muito inferior ao do dinamismo da produção.
No Nordeste, o crescimento econômico fez triplicar o PIB (de US$ 20,8 bilhões em 1970 atingiu US$ 65,3 bilhões em 1993, medidos a preços de 1993 pela SUDENE), enquanto o produto per capita apenas duplicou no mesmo período (passou de US$ 740 para US$ 1.486). Esse já é um primeiro indicador importante de que a elevação do padrão de vida não decorre linearmente do mero crescimento econômico, embora seja ainda imperfeito, pois o PIB per capita esconde um dos mais graves problemas do Nordeste: a forte concentração da riqueza e, portanto, da renda regional.
Quando se observam alguns indicadores como o produto per capita e a esperança de vida, verifica-se que os índices apresentados pelo Nordeste não só se elevaram nos últimos anos, mas também tenderam a se aproximar mais da média nacional. O produto por habitante do Nordeste era 43% da média brasileira em 1970 e passou a 55% em 1990, segundo dados da SUDENE (1992). A esperança de vida ao nascer do nordestino era 84% da média brasileira em 1970 e 91% em 1988, segundo dados da Fundação IBGE.
No entanto, apesar dessa tendência, os dados mostram que a situação social no Nordeste é a mais grave do País. O PIB per capita continua sendo o mais baixo do Brasil e a esperança de vida ao nascer do nordestino (58,8 anos, em 1988) é a menor entre todas as regiões brasileiras, sendo 84% da média apresentada pelo habitante da região Sul, onde os padrões médios de vida são os melhores do Brasil.
Em outros indicadores sociais, a convergência para a média nacional não se deu. Ao contrário, o Nordeste diverge dessa tendência e continua destacando-se negativamente.
Em termos de níveis educacionais, acesso domiciliar ao abastecimento de água, ou índice de mortalidade infantil, por exemplo, a situação relativa das populações nordestinas vem piorando, quando vista no contexto nacional. Entre 1970 e 1989, os níveis da população maior de 15 anos e sem instrução no Nordeste melhoraram, caindo de 55% para 36%, mas nas outras regiões essa queda foi bem maior. A região tinha, portanto, às vésperas dos anos 90, uma situação educacional relativamente mais desfavorável num momento em que a educação se afirma como variável estratégica.
Por sua vez, os índices de mortalidade infantil entre os nordestinos também melhoraram, passando de 151,2 por mil nascidos vivos, em 1970, para 80 por mil em 1988. No entanto, quando comparados à média nacional, esses índices eram 29% maiores em 1970 e 68% em 1988. Só no Norte esse crescimento também aconteceu no mesmo período, mas foi muito menos intenso.
Em termos de acesso domiciliar ao abastecimento de água, a situação do Nordeste também se agravou no contexto nacional. Embora a cobertura regional tenha crescido de 9,7% para 42% dos domicílios entre 1970 e 1989, ampliou-se a distância entre a taxa de cobertura nordestina e a taxa média brasileira. Esse fato mostra que as políticas sociais recentes foram menos eficazes no Nordeste do que no resto do País.
O Nordeste continua sendo um grande desafio nacional no que tange à dívida social. A região tem 29% da população brasileira, mas possui:
· 55% dos analfabetos do País (Fundação IBGE);
· 55% dos indigentes brasileiros (IPEA);
· 45% das famílias pobres do Brasil (com rendimento per capita inferior a meio salário mínimo);
· 50% das pessoas com consumo calórico muito baixo.
Por outro lado, o Nordeste tem 26% da população economicamente ativa ocupada brasileira, mas tem 36% das pessoas ocupadas recebendo até dois salários mínimos e apenas 15% dos trabalhadores que contribuem para a Previdência Social. Segundo a Fundação IBGE (PNAD), apenas 29% da população ocupada no Nordeste contribuía para a Previdência, contra um índice de 50% para o total do Brasil, em 1989. Ao mesmo tempo, a percentagem (42%) de empregados com carteira assinada na população ocupada no Nordeste era muito inferior à média brasileira (60%), em 1989.

5.1. As Diferenciações Sociais Internas
Igualmente ao que foi registrado neste relatório para a dinâmica econômica, as condições sociais da população nordestina são muito desiguais e muitas tendências gerais não se reproduzem de maneira idêntica em todos os estados ou nas áreas urbanas e rurais da região. A riqueza é muito concentrada no Nordeste, e os contrastes sociais são enormes. Além disso, nas últimas décadas, a dinâmica e as transformações na base produtiva instalada na região foram muito mais intensas e profundas que as alterações para melhor na qualidade de vida dos nordestinos. O crescimento econômico reduziu de maneira insuficiente os déficits sociais, e a crise dos anos recentes só fez agravar o quadro social regional.
Estimativas recentes de níveis de concentração da renda no Nordeste revelam a piora dos já elevados padrões de concentração (o índice de Gini se elevou, passando de 0,596 para 0,638 entre 1970 e 1988). Enquanto os 40% mais pobres tiveram reduzida sua participação na renda gerada na região de 8,8% em 1970 para 7,8% em 1988, os 5% mais ricos ganharam participação, indo dos 38,8% para os 42%, no mesmo período (Albuquerque e Villela, 1991). Tolosa (1991), em estudo que estima o número de pobres no Brasil (pessoas com menos de um quarto do salário mínimo de renda familiar per capita), revela que no Nordeste a pobreza aumentou: de 19,4 milhões em 1970, os pobres passaram a 25,8% milhões em 1988, tendo sido maior o crescimento nas áreas urbanas (onde o contingente pobre passou de seis milhões para 10 milhões de pessoas, enquanto o número de pobres rurais ficou estável: em torno dos 13 milhões de pessoas).
O agravamento da situação social nas zonas urbanas do Nordeste tem na questão migratória uma de suas explicações. A emigração funciona como “válvula de escape” da tensão social, dada sua dimensão. Entre 1960 e 1980, estima-se que deixaram a região cerca de quatro milhões de nordestinos (quase a população do Recife e de Salvador juntas, conforme dados de 1980). Na última década, a crise parece ter exercido importante papel inibidor do fluxo emigratório para outras regiões. Esse fluxo buscou, então, os centros urbanos da própria região e promoveu a generalização rápida do processo de favelização nas médias e até nas pequenas cidades do Nordeste. Até porque os fatores de expulsão não cessaram de exercer seu papel.
Apesar do intenso crescimento da pobreza nas áreas urbanas, a questão social nas zonas rurais é relativamente mais grave. Pelo estudo de Tolosa (1991), três em cada quatro nordestinos (75%) da zona rural está na faixa de pobreza que ele definiu, contra um em cada dois (46%) nas zonas urbanas.
Nas zonas rurais mais tradicionais do Nordeste, o problema social é muito grave. Na Zona da Mata, a demanda muito irregular por trabalho (elevada na colheita e reduzida no plantio e entressafra) determina condições de emprego adversas para a maioria dos trabalhadores, hoje predominantemente constituída por “bóias-frias” que só conseguem emprego seis meses durante cada ano (um em cada três trabalhadores). O emprego infantil continua sendo a estratégia usada pelas famílias para melhorar a renda familiar, tanto que as taxas de analfabetismo são elevadíssimas entre os canavieiros (80% em alguns locais, segundo pesquisa recente).
No semi-árido, a seca continua sendo um problema social agudo, levando praticamente toda a população de trabalhadores rurais e pequenos produtores a buscar os programas assistenciais do Governo a cada estiagem mais prolongada, como aconteceu em 1993.
Não existem apenas diferenciações entre as áreas urbanas e rurais. Entre as diferentes unidades da Federação que integram o Nordeste, algumas observações podem ser feitas no que diz respeito ao seu quadro social.
Chama a atenção, primeiramente, a tendência ao aumento mais forte da concentração de renda nos estados cujo dinamismo econômico recente foi relativamente mais intenso, como no Maranhão, Ceará e Bahia, sendo menos intenso em Pernambuco e Paraíba cujas economias não tiveram grandes impulsos nos anos pós-70. No Estado do Ceará, os 5% mais ricos apropriam maior percentual da renda estadual (46%); no Piauí, os 40% mais pobres detêm menor participação na renda gerada no Estado (6%).
Em segundo lugar, cabe destacar as diferenças nos níveis do produto per capita dos diversos estados. Em 1992, a renda média do piauiense era metade da do baiano, respectivamente os estados de menor e maior PIB per capita da região. Vale salientar que a distância era ainda maior em 1970, quando esse indicador no Piauí era 42% do seu similar na Bahia.
Tomando-se os indicadores mais usualmente utilizados para análises sobre a qualidade de vida das populações, observam-se algumas distinções entre os estados. A Bahia e Pernambuco apresentam as situações mais favoráveis da região quanto aos níveis de alfabetização, taxas de mortalidade infantil e esperança de vida no caso baiano e acesso a água e energia no caso pernambucano, onde os níveis de alfabetização são também relativamente elevados, quando comparados aos dos demais estados.
No outro extremo, o Estado do Piauí apresenta as condições sociais mais precárias, reveladas pelos mais diferentes indicadores sociais. A Paraíba e o Maranhão seguem, nesse sentido, o Piauí. O acesso a serviços de água e energia é muito restrito no Maranhão. O Estado da Paraíba possui a mais alta taxa de mortalidade infantil do Nordeste e a mais baixa esperança média de vida.
Como se verifica mais uma vez nessas observações, não há relação linear entre transformações e crescimento econômico e melhoria das condições de vida das populações estaduais.
A realidade social revela também um Nordeste heterogêneo e complexo, múltiplo, diferenciado, apesar de alguns traços comuns marcantes.

5.2. Velhos e Novos Atores
No contexto das transformações econômicas e sociais operadas nos anos recentes no Nordeste, cabe identificar as classes e segmentos sociais tradicionais que permanecem importantes, bem como a emergência de novos atores sociais. Estudo recente da socióloga Inaiá de Carvalho (1989) aborda essa temática, ainda pouco tratada na literatura sobre a região, sobretudo quanto aos segmentos emergentes.
A primeira constatação importante do trabalho é o intenso crescimento, nas últimas décadas, do número e proporção de assalariados entre a população ocupada do Nordeste, superior ao que se observa para o conjunto do Pais. Esse indicador evidencia o avanço do processo de proletarização, inclusive no campo nordestino, seja em áreas antigas, como nas da cana-de-açúcar, seja nas novas áreas, ocupadas com atividades modernas. Um proletariado moderno aparece também nas áreas urbanas, ligado a atividades industriais (os petroquímicos de Camaçari, por exemplo) e terciárias (empregados do sistema financeiro, do setor de informática, etc.).
Nas classes médias urbanas, por sua vez, mudanças interessantes são observadas. Algumas classes empobrecem (funcionários públicos), outras progridem (informáticos, médicos, administradores, consultores, técnicos em “marketing”, executivos de grandes grupos econômicos, empregados de grandes empresas estatais etc.).
Observa-se uma reciclagem também nas velhas oligarquias. As novas gerações diversificam as atividades dos antigos grupos empresariais de base familiar (migram para atividades urbanas, como a construção civil, a indústria de transformação, o turismo, o comércio etc.). O eixo básico dessa reciclagem parece ter sido a política de subsídios, incentivos e os favores de toda ordem concedidos pelo Estado brasileiro a uma das mais fortes bases conservadoras do País.
Merecem referência também algumas alterações nas elites urbanas. Da intensa industrialização dos anos 70 e seguintes, emergem novos empresários industriais, particularmente nas principais áreas metropolitanas da região, mas não apenas nelas. Em alguns casos, o empresário local se articulou com empresários de porte nacional que aqui vieram investir no movimento de “regionalização” do grande capital. A elite industrial cearense é geralmente citada como exemplo desse novo tipo de ator social que ganha espaço econômico, social e político no contexto nordestino das últimas décadas. Parcela da burguesia baiana se fortaleceu, investindo nos setores modernos; alguns até na petroquímica, outros na construção civil, no grande comércio, ou na atividade imobiliária.
Nas novas áreas de expansão agropecuária ou agroindustrial, novos atores podem igualmente ser identificados, muitos deles não nordestinos. Paulistas, gaúchos, catarinenses e paranaenses se fazem presentes nas novas atividades do oeste baiano, sul do Maranhão e Piauí, e outras áreas de irrigação.
Mesmo o setor terciário, inclusive no segmento dito informal, merece revisão na literatura especializada. Dados mais recentes sinalizam que autônomos não-refugiados do desemprego apresentam níveis de renda mensal mais altos que os de seus análogos do dito setor formal da economia. O informal depositário do subemprego ainda é muito importante nas áreas urbanas nordestinas, mas dentro dele surgem profissionais egressos do movimento de terceirização e profissionais de atividades emergentes e modernas da economia nordestina.
Nesse aspecto, portanto, mais uma vez, a realidade nordestina mudou e tornou-se mais complexa e diferenciada. É impossível apreende-la a partir dos estereótipos tradicionais.

6. Conclusão: Nordeste, Nordestes - que Nordeste?
A análise da dinâmica das atividades econômicas confirma o que haviam observado com propriedade, vários estudos recentes sobre o Nordeste. Vários fatores moldaram, ao longo dos últimos anos, uma integração econômica tal que as diversas dinâmicas regionais foram soldando-se. O Nordeste, entendido como região autônoma, locus de uma dinâmica própria no seu movimento de acumulação de capitais, não mais existe. Não só o Nordeste. No Brasil, nesse novo contexto, não existem mais “economias regionais”, mas “uma economia nacional, regionalmente localizada”. A dinâmica econômica nacional “solidarizou” as dinâmicas regionais preexistentes. Características específicas persistem existindo, mas o comportamento econômico geral foi impondo tração e movimentos comuns.
No Nordeste, esses movimentos criaram novas áreas de expansão que abrigam, hoje, estruturas modernas e dinâmicas, as quais convivem com áreas e segmentos econômicos tradicionais, contribuindo, assim, para tornar a realidade regional muito mais diferenciada e complexa. Dessa perspectiva, pode-se falar de “vários nordestes”: do Nordeste do oeste baiano e do Nordeste canavieiro do litoral do Rio Grande do Norte a Alagoas; do Nordeste agroindustrial do submédio São Francisco e do Nordeste cacaueiro do sul baiano; do Nordeste minero-metalúrgico e agroindustrial do Maranhão e do Nordeste semi-árido, dominado pelo tradicional complexo gado/agricultura de sequeiro etc. Cada um com suas particularidades e seus atores, muitos deles não nordestinos. Por fim, os dados (embora precários, em alguns casos) sobre as recentes tendências da interação econômica do Nordeste mostram a atuação de articulações novas,[13] muitas das quais tendentes a “arrastar para fora” partes importantes do Nordeste. Se isso for verdadeiro, o Nordeste ficaria reduzido à sua parte que tem demonstrado tendência recente a um “certo isolamento relativo”. Nesse sentido, algumas questões começam a ser colocadas, tais como: O Maranhão é Nordeste? A Bahia ainda é Nordeste? Onde termina o Centro-Oeste e começa o Nordeste (no seu “lado” oeste)? O sul do Maranhão e Piauí e o cerrado baiano não são mais semelhantes a Tocantins que a Pernambuco? Essas são questões apenas para o Nordeste?

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[1] . Este artigo é uma versão revisada de artigo com mesmo título publicado in Tânia B de Araújo’s Ensaios sobre o desenvolvimento brasileiro - Heranças e Urgências. 2000.
[1] Essa região corresponde ao Nordeste considerado como área de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, SUDENE, excluindo-se, portanto, a área do Polígono da Seca do Estado de Minas Gerais.

[2] Cabe lembrar que antes do “milagre brasileiro, em 1967, a presença nordestina na agropecuária do País era ainda maior (26,5%) e que sua presença na indústria e setor terciário nacionais cresceu nos últimos anos. O Nordeste representava, em 1967, 9% do setor industrial e 12%: dos serviços do Brasil (SUDENE, 1992).

[3] . O pólo de Camaçari alterou estruturalmente a economia baiana, aumentando o peso do setor secundário de 12% em 1960 para quase 30% do PIB estadual em 1990. Em 1989, os empregos diretos (25 mil), mais os ligados às prestadoras de serviços (31 mil), representavam 19,6% do emprego gerado na indústria de transformação do Estado.

[4] . O pólo têxtil e de confecções de Fortaleza desponta como um dos importantes centros do setor, tanto em âmbito regional como nacional. Entre 1970 e 1985, o número de estabelecimentos têxteis do Ceará cresceu de 155 para 358, enquanto os ligados ao vestuário passavam de 152 para 850. Em 1991, segundo o Sindicato da Indústria de Confecções do Ceará, o pólo cearense reunia cerca de três mil empresas, gerava 60 mil empregos diretos e era responsável por 12% do ICMS do Ceará (Lima e Katz, 1993).

[5] . O complexo minero-metalúrgico do Maranhão está associado aos desdobramentos do Programa Grande Carajás (PGC) e ao interesse do capital multinacional em diversificar suas fontes de abastecimento de matérias-primas. Em função desses investimentos, impactos importantes já se notam nos anos 80: o PIB total do estado aumentou de US$ 2 bilhões em 1980 para US$ 3 bilhões em 1987, tendo o produto da indústria ampliado sua participação no total estadual de 14,3% para 21,8%.

[6] No Censo Demográfico de 1920, a Fundação IBGE tratava como região única o Norte e o Nordeste. O espaço nordestino dissolveu-se, durante muito tempo, numa entidade geográfica mais ampla: “as províncias do Norte”.

[7] Essa maior articulação e a crescente presença econômica dos novos segmentos empresariais urbanos no Ceará estão na base da ruptura política vivenciada pela sociedade local a partir da segunda metade dos anos 80.

[8] Além da Região Metropolitana do Recife, outros centros menores sofrem o impacto da perda dessa função atacadista, como são exemplos Caruaru (PE) e Campina Grande (PB).

[9] As 910 indústrias apoiadas pela SUDENE respondem por quase metade da produção industrial do Nordeste e geram um terço dos empregos industriais dessa região.

[10] Segundo pesquisa realizada pela SUDENE na indústria incentivada até 1978, portanto quando ainda não predominavam os grandes complexos de bens intermediários , o parque instalado comprava quase metade (48%) de seus insumos fora do Nordeste, sendo 36% no mercado nacional e 12% no mercado externo (ARAÚJO, 1981).

[11] Isso para não falar no movimento do capital financeiro, que também, é submetido à intensa centralização e à dinâmica disseminação, de sua presença no território do País.

[12] Cabe destacar o maior dinamismo baiano na presença das grandes empresas. Em 1975, Bahia e Pernambuco tinham praticamente o mesmo número de grandes empresas. Em `990, a Bahia possuía um número uma vez e meia maior (49 contra 19 de Pernambuco), segundo a Revista Visão: Quem é Quem na Economia Brasileira.

[13] Ao longo dos anos 70, o Nordeste abre-se mais para o resto do País que para o exterior (a relação exportação por vias internas e cabotagem/PIB cresce, e a relação exportação para o exterior/PIB declina). Já as compras a outras regiões perdem peso, enquanto as importações feitas do mercado externo se mantém no mesmo patamar (a relação M por vias internas e cabotagem/PIB declina, enquanto a relação M do exterior/PIB se mantém constante) (SUDENE, 1985).